A SENTENÇA DA MINISTRA WEBER: ENTRE A OPINIÃO E O DIREITO
A SENTENÇA DA MINISTRA WEBER: ENTRE A OPINIÃO E O DIREITO
Há poucos dias deu-se início ao julgamento da ADPF 442, uma ação impetrada pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em 2017 e que pretende descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação, por qualquer motivo. A relatora da ação, Ministra Rosa Weber, que está em processo de aposentadoria, aproveitou a oportunidade para colocar o pleito em votação às pressas, antes do término do seu mandato como ministra daquela corte e foi a primeira a votar favoravelmente à referida demanda. Neste artigo, pretende-se abordar algumas partes do voto da ministra para demonstração da contradição existente em seus argumentos.
Em primeiro lugar, na justificação de seu voto a ministra afirma que “a criminalização perpetua o quadro de discriminação com base no gênero, porque ninguém supõe, ainda que em última lente, que o homem de alguma forma seja reprovado pela sua conduta de liberdade sexual, afinal a questão reprodutiva não lhe pertence de forma direta”. Ou seja, se os homens possuem um costume promíscuo e não são condenados por isso, já que não são eles a suportarem o “fardo” da gravidez, a saída para resolver o problema, de acordo com o voto da ministra, será nivelar as mulheres ao mesmo patamar de irresponsabilidade, acrescentando às mesmas o direito de matar uma vida que não tem culpa das decisões tomadas pelos seus genitores.
Afirmar que a questão reprodutiva não pertence ao homem de forma direta, é ir contra a natureza humana em si, o que só seria possível num contexto em que uma mulher pudesse realizar a reprodução totalmente independente das funções biológicas masculinas, de forma assexuada. Ainda que hoje em dia seja disseminada essa abominação chamada Reprodução Assistida, é do conhecimento de qualquer um que não há possibilidade do surgimento de uma nova vida humana sem que os gametas masculinos e femininos concorram para tanto. Esta afirmação da ministra, levada ao pé da letra, corrobora com os erros presentes em jargões como “meu corpo, minhas regras”, como se o bebê gerado, fosse tão somente uma extensão do corpo da mulher. Qual o significado afinal da afirmação “não lhe pertencer de forma direta?” A ministra não deixa isso claro e assim, o assunto cai num vácuo geral, o que no caso de uma sentença de vida e de morte sobre outrem, é um precedente bastante perigoso.
Em seguida, a Ministra apela para a questão de raça para fundamentar o voto da seguinte forma: “ainda, cumpre assinalar que abortos inseguros e o risco aumentado da taxa de mortalidade revelam o impacto desproporcional da regra da criminalização da interrupção voluntária da gravidez não apenas em razão do sexo, do gênero, mas igualmente, e com mais densidade, nas razões de raça e condições socioeconômicas”. Ainda que não fosse do interesse direto da ministra, essa afirmação acaba soando um tanto eugenista, de modo que quer fazer abranger a prática do ab0r0 às pessoas pobres e de determinada raça, por considerarem discriminadas ao não poderem matar os seus próprios. A verdade é que a liberação do aborto para determinados grupos é que se trata efetivamente de uma discriminação. Se alguém comete um ilícito por ter mais dinheiro e condições, quer dizer que este ilícito deve ser estendido para que as demais pessoas possam praticá-lo? Não seria uma abominação essa questão?
A certa altura, argumenta a ministra que “o que ocorre no mundo jurídico se o nascituro, herdeiro ou donatário, não chegar a nascer? Não há produção de efeitos jurídicos, uma vez que o exercício dos direitos é condicionado ao seu nascimento com vida, quando ele adquire personalidade civil”. Embora a fase da vida humana que vai desde a concepção até o parto, não produza determinados efeitos jurídicos, ele não deixa de ter reconhecimento, então perguntaríamos o porquê das políticas pré-natal? Porquê das inúmeras campanhas de proteção à gestante? Ou será que a ministra considera o bebê concebido como um objeto da pessoa, como um escravo que apesar de humano, é um ser inferior que pode ter o uso de vida e de morte de acordo com o arbítrio do seu amo?
A doutrina jurídica confirma os direitos dos nascituros como “expectativa”, especialmente no Código Civil. O que pode prejudicar esta expectativa é a perda da vida do bebê em gestação, porém, em nenhum momento as leis brasileiras respaldam a intervenção deliberada, no sentido de inviabilizar o nascimento, de forma a fazer com que o nascituro, venha a perder os seus direitos pela expectativa frustrada. A ministra quer com isso, aplicar uma exceção e transformá-la em regra, equiparando um direito perdido devido a um acidente com a prática deliberada.
Veja-se que o Código Penal, em seu artigo 125, prevê pena para um aborto provocado por terceiro. Ou seja, num caso concreto, quando alguém realiza algum ato contra uma gestante que resulta em aborto, o réu responde por crime justamente pelo efeito colateral específico do prejuízo à gestante pelo bebê perdido.
É bastante compreensível que nesta sentença, a Ministra está na verdade querendo fazer valer sua opinião pessoal, a partir de questões externas como raça, pobreza, inviabilidade acidental de um nascimento como fatores que possam determinar o valor de uma vida humana.
Por fim, o mais assustador e flagrante é que ao final, a Ministra afirma abertamente que o Supremo Tribunal está acima da decisão de qualquer cidadão por meio de seus representantes, alegando que Legislativo não tem competência para decidir sobre a questão: “Não pode o Supremo Tribunal Federal, segundo penso, furtar-se ao dever de fazer valer a Constituição da República diante de ato do Poder Legislativo materializador de escolha política que, ao sacrificar os direitos fundamentais das mulheres protegidos pela Constituição, ingressa em terreno que lhe fora interditado.”
Se a ADPF for aprovada nestes termos, infelizmente, estaremos diante de uma decisão deliberada contra a vida de inocentes e sem fundamento no reconhecimento legal vigente. Direitos naturais e positivos violados por decisão de alguns, não se pode dar outro nome a isso senão a um autoritarismo que levará inevitavelmente a um genocídio de inocentes.
Juliano Antonio Rodrigues Padilha – Coordenador do Núcleo de Estudo e Formação da Casa Pró Vida Mãe Imaculada